Estou eu saindo da terceira aula que aconteceu no primeiro B, quando fui abordado por uma professora perguntando de maneira vaga: "Será onde é que eu vou agora, qual minha turma, professor?". Fico ali meio que perplexo com essa pergunta, porque, na verdade, não sou eu que tenho que saber. Respondo para ela: "Não sei, professora, não sei qual é a sua turma". E ela simplesmente vira para mim e, com sobressalto, me adjetiva de bruto: "Como o senhor é bruto, professor!". Ela entra na sala e ela continua falando para os estudantes que eu sou bruto e até pergunta para eles: "Não é, gente? Ele não é bruto?".
Essas atitudes me deixam tão triste, pois isso demonstra a covardia, a falta de cumplicidade entre os docentes e até mesmo a necessidade de rotular um colega. Ela tenta influenciar e induzir os estudantes a reafirmar esse rótulo.
O dia se passou, a manhã encerrou, o sinal tocou, os estudantes se encaminharam para o almoço e fiquei com isso na minha mente. Quando retornamos, uma hora da tarde, ela entra na sala, olha, e eu falo: "Olha quem chegou! A professora que me acha bruto". E ela continua a reafirmar que não é só ela que acha isso, que outras pessoas também acham, que muitos estudantes já falaram para ela.
E isso me deixou mais triste, pois estamos falando de uma pessoa que, quando ela chegou na escola, eu acolhi, dei conselhos, ouvi seus lamentos, aliás oww ser humano pra reclamar. Eu a abracei, inclusive quando os estudantes falam mal da aula dela, eu os repreendo dizendo que cada um tem sua abordagem didática para lecionar.
O que me deixou mais triste foi ouvir isso de uma pessoa que eu ajudei tanto. Uma pessoa que queria, inclusive, desistir da docência pelas cobranças, pela indisciplina dos estudantes, pelos maus-tratos, muitas vezes, com os seus superiores. Ela queria desistir da docência, mas eu a aconselhei, disse para ela ter paciência, calma, tranquilidade. Inclusive, em uma determinada ocasião, ela me chamou para socorrê-la em um atrito (e estou sendo muito eufêmico aqui, na verdade era uma briga) e ela estava pavorosa, sem saber como conter a briga. Então, prontamente, ela me chamou, e eu resolvi a questão.
Agora me pergunto: como eu vou saber onde essa professora iria lecionar? Uma pessoa que só me conhece há seis meses dizer isso de mim.
Escrevo isso como uma forma de desocupar alguns andares da minha mente com este rótulo que ela lançou. O sentimento que me invade é de tristeza por ver que uma pessoa que eu ajudei tenha uma atitude dessas comigo.
Olha, o processo terapêutico tem me ajudado muito a me entender. E tenho percebido que, de fato, exagero em alguns posicionamentos que tomo, mas, por enquanto, tem dado certo. Desde a Bahia, passando por Corrente, Piauí, até aqui no Ceará, tem dado muito certo. E, por todos os lugares que eu passo, tento deixar uma marca filosófica, tendo em vista que a Filosofia é uma disciplina que muitas pessoas marginalizam. O próprio sistema também se encarrega disso. Então, eu não posso ser mais um. Tenho que imprimir um legado filosófico onde estiver, essa é a obrigação que eu tenho em defesa dessa disciplina tão sofrida.
Por isso, eu já tentei muitas vezes não desenvolver projetos, ficar na minha, simplesmente ser um professor 'feijão com arroz'. Mas eu não consigo. Não consigo e não vou lutar mais contra isso, contra o meu jeito de ser. Vou realizar meus projetos, minhas feiras, minhas oficinas. Enfim, para você ter uma ideia, nesse ano de 2024 eu já realizei mais de cinco projetos na escola onde trabalho: Projeto Descobrindo Emoções, Projeto Agosto Lilás - Chega de Violência contra a Mulher (inclusive fomos para os sinais, para os semáforos da cidade, fizemos ali uma parada entre os carros reivindicando, protestando), Projeto Questionando a História (que consiste numa série de ações, charges, painéis sobre personalidades afro- indígenas), Socratizando e o GM Podcast, orientei três projetos do Ceará Científico sendo que um deles ganhou o terceiro lugar.
O que ela quer revelar com esse comentário? Seria ressentimento por eu ter ganho o terceiro lugar na amostra escolar e ela ter ficado de fora? Talvez seja isso. Ou talvez seja inveja do meu jeito de ser com os estudantes. Mas qual atitude eu cometi contra ela para ela vir falar que eu sou bruto? Fiquei martelando isso o dia inteiro. O que eu fiz para ela ter essa impressão de mim?
Não sei!
Após ter questionado, ela também não me falou o porquê dessa fala, desse rótulo que ela me colocou. Disse que os estudantes têm um sentimento paradoxal comigo, porque, quando saí da sala de aula para o almoço, eles ficaram dizendo: "Professor, o senhor deveria ter mais aulas com a gente".
Esse sentimento paradoxal dos meninos comigo... Mas eu já percebi que incomodo algumas pessoas que não sabem lidar com minha forma criativa de ser. Primeiro, pelo meu temperamento, por não saber lidar muito bem com autoritarismo. Segundo, pela minha proatividade. As pessoas não gostam de ver outros colegas executando projetos, movimentando a escola, acham que estamos querendo aparecer. E terceiro, pela minha forma cênica de viver. Minhas caras e bocas, minhas danças com os estudantes. É a minha forma de lidar com todos.
Mas um comentário como esse me deixa reflexivo. Talvez fosse essa a intenção dela, me deixar mal ou talvez ela não estivesse bem Mas paciência. Estou aqui dando vazão a esse sentimento. Espero que logo, logo ele passe. E vai passar. Quando você terminar de ler esse texto, com certeza ele já terá passado.
Lembre-se de ser você mesmo.
Bruto não, Assertivo!